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Il.mo Ex.mo Senr.
Devo afirmar a V.a Ex.a, que sou católico apostólico romano. Nesta religião nasci, nela tenho vivido, e nela espero morrer. Dela tenho recebido, nas minhas maiores aflições, o salutar bálsamo da resignação.
Nunca discuti sobre estes elevados assuntos, porque nem quero ser convencido, nem convencer.
Uma religião, cuja síntese se cifra em amar a Deus sobre todas as coisas, e ao próximo, como a nós mesmos, encerra em si, a meu ver, o manancial de todas as virtudes, a que o fraco género humano pode aspirar.Não pergunto a ninguém donde vem, nem a quem adora. Por mim exerço os deveres da minha religião como a minha fragilidade o permite, sem ostentação, nem alarde, mas sem vergonha; e nenhum acto meu, de que tenha conhecimento, me pode desmentir.
Admirou-me portanto assaz, que V.a Ex.a na nota, com que ontem acompanhou a oferta do seu opúsculo “O homem e o macaco” viesse proclamar-me a necessidade de pôr um machado à raíz de todas as crenças primitivas. Julgava eu que, em semelhantes delicadas matérias, tinha o direito de exigir que tivessem comigo uma reserva, pelo menos igual à reserva que uso para com os outros.
Por curiosidade literária, e desde muitos anos, tenho lido, superficialmente é verdade por falta de sólido alicerce, Darwin, Haeckel, Broca, Topinard, e outros, sem que a minha crença fosse abalada. E sempre neles admirei, que colocando-se na região mais elevada da Ciência, evitassem as questões irritantes: exemplo, para mim, honroso e digno.
Resolvi-me a expor francamente a V.a Ex.a a impressão que me causou a sua nota, porque o meu silêncio absoluto poderia ser tomado em pior conta; e faço-o por escrito porque não desejo acrescentar uma só palavra mais àquelas, que deixo escritas.
Espero que V.a Ex.a no meio das suas novas lidas, não perderá nada da placidez e do remanso de espírito, tão necessários na prática da vida.
Sou com toda a consideração
de V.a Ex.a
Muito atento, venerador e Amigo
José do Canto
Sua Casa 8 de Abril de 1881